Poesia não foi feita pra ser lida
Seu verbo é do instante da palavra
Sua língua não se fixa com tinta
Seu grito é de dizer sem vistas longas
É de escutar, sentir, tremer
Tem que olhar e seduzir
Tem que saber o Zé de ponta a ponta
Com ponte e pé de notas
Tem que dissolver, digerir, ser
Pra revestir feito algodão
Pra acolher em pés descalços
E correr sem deixar nó
Poesia não foi feita pra ser lida
Tem que ter chão pisado, vida feita
Sorrir feito quarta-feira plena
Desejar como vitrine enfeitiçada
É de palavra essa escrita
Palavra dita, transitória e suada
Céu, limite e feira grande
Feriado, criação e novidade
É de lambedor, óleo de pequi
É de verso ou de memória
Do meu verbo só história
Que se conta na mesa que passei
Foi da sanfona em correria que me veio
A certeza de que canto só cantado
Que lembranças de domingos bem passados
Nenzinha em desmanche acolhedor
Foi do sorriso e do grito perfumado
Que a palavra se fez sentida e respirada
Que a poesia de tanto ser mastigada
Serviu-se em minha veia por amor
Tota, mesa posta, cantoria
Era grande e era larga a romaria
De seguinte em seguinte
Feito de tudo, era pó
Fé, piedade e respeito
Carregar o que cresceu e não tem jeito
Só caminhando e sendo mesmo só
Bela ninando cria no peito
Foi num domingo que me veio
Assim, a dama
Sem passo, passarela
Sem ter cama
Sem papel, sem teto, sem pitó
Foi de vento de menino
De sandália de areia
De cabelo desatado
Desembestado laço
Seda silencia o que é pior
Poesia não foi feita pra ser lida
Aprendi entre vinhos e teclados
Entre versos de dizer embaraçados
Amizade esparramada de alegria
É de nós essa querida, essa magia
Obrigada por ser grande e sofredora
Por me acolher e deixar ser amadora
Dessa arte que nasceu e que se cria
Para: Jonara Medeiros